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eixo (série) - 2021 - lápis de cor e papel vegetal sobreposto 

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No final de 2019 uma pancada de carro abalou minhas estruturas. Na hora, não percebi a gravidade. Segurei firme o meu eixo para não “descolar” a cabeça do resto do corpo. Braços e pernas mantiveram a direção do que estavam fazendo, guiando mãos e pés que seguiam como ferramentas executando suas funções: o modo era dirigir. Nem a pancada parou essas funções. O susto, o eixo, os dois carros, tudo se movia, mas eu me mantinha firme em minha função. Depois de algum tempo, duas vértebras se mostraram deslocadas e não me deixaram mais dormir, mover ou estar tranquila.

Procurei ajuda profissional para “pôr tudo no lugar de volta”. Mas já não dava. Não era possível, para mim, voltar ao lugar.

Eu teria que achar outro. 

Nessa busca pelo eixo, decidi fazer o caminho de busca pelas sensações de estruturação do corpo partindo do cóccix até o atlas, que por sua vez me levou para o tempo em que eu não andava ainda, o tempo da cabeça mais pesada do que o corpo, o tempo das cócoras, do chão mais perto do que o céu e dos pés de adultos sendo mais próximos do que as suas cabeças. 

Fiz um caminho sutil de retorno ao início do corpo fora do ventre, num estudo cheio de presença e coragem que me fez chorar o susto da pancada, os vazios antes dela e os encontros remotos com meu corpo que me proporcionou ganhar a dimensão de algo que chamei de vontades primordiais - estas, olhadas com afinco e urgência, que me levaram para a vontade de desenhar com a mesma seriedade que eu desenhava quando criança. 

A partir das vontades primordiais a busca, então, foi pelo desenho que precisava existir independentemente de qualquer coisa. O desenho que comunicava algo interno muito essencial. O desenho feito como movimento interno com riscadores empunhados por mim que na infância eram como extensões do meus braços. 

Desde esse percurso de voltar para o meu eixo que eu fiz a escolha de desenhar usando lápis de cores. Porque eu sempre gostei de suas intensidades e de suas dissipações, porque me foram dados de presente em inúmeras ocasiões importantes, e porque estão à mão desde então, em todos os lugares onde estou. Tenho uma lata com 80 deles, e que já completaram mais de 30 anos. E é com eles, e com mais alguns outros adquiridos durante o percurso, que decidi voltar ao desenho necessário. O desenho reestruturante de eixos, que precisa ser feito como ritual para o nascimento de algo que ainda não se compreende totalmente. O desenho-dança ou desenho-brinquedo, que insiste e vai nos dando pistas de como quer existir conforme o experimentamos. 

Assim como os eixos estruturam o meu corpo, esses desenhos me pedem uma ideia de movimento e leveza. Nas formas intuídas, lido com a cor que se intensifica e se dissipa, em movimentos ascendentes e descendentes. O processo de construção dessas formas, que às vezes geram composições, mas outras vezes apenas se posicionam lado a lado, me lembram algumas construções sonoras que faço, que vez por outra nascem por necessidade de concatenação das notas e frases sonoras que vou descobrindo no pensamento ou no piano. Por isso, essas estruturazinhas foram feitas em papéis translúcidos, onde a luz e outras camadas com mais estruturas possam gerar movimento, combinando novas possibilidades de composições, possibilitando novas estruturações, como num convite, brincadeira ou jogo.

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